Tradução

sábado, 29 de dezembro de 2007

A Rejeição dos Réprobos

João Calvino
A rejeição dos réprobos procede também da vontade divina, não da presciência de suas obras más

“Tratemos agora dos réprobos, de quem o Apóstolo fala também na passagem já indicada, associando, ao mesmo tempo, os eleitos [Rm 9.13]. Ora, como Jacó, sem ainda nada merecer por suas obras, é recebido à graça; assim também Esaú, ainda de nenhum inclinado ao delito, é dito em ódio. Se volvermos nossos olhos para as obras, fazemos grave injuria ao Apóstolo, como se ele não percebesse como algo óbvio aquilo que para nós é claro. Com efeito, que ele não percebeu é fácil de ser provado, uma vez que ele insiste expressamente, dizendo que não havia ainda nada de bom ou de mau a ser mostrado de que um é eleito e o outro rejeitado; de sorte que assim prova que o fundamento da predestinação divina não está nas obras.”

Além disso, quando o Apóstolo levantou a objeção se porventura Deus é iníquo, não faz uso desta objeção que lhe teria sido a mais firme e a mais evidente defesa da justiça, a saber, que Deus recompensou a Esaú segundo sua maldade; ao contrario, contentou-se com solução diversa: que os réprobos são suscitados para este fim, ou seja, para que por meio deles a glória de Deus resplandeça.

Finalmente, ele adiciona a cláusula: “Deus se compadece de quem quer compadecer-se e endurece a quem quer endurecer” [Rm 9.18]. Vês como o Apóstolo entrega ao mero arbítrio de Deus a um e a outro? Portanto, se não podemos assinalar outra razão por que Deus usa de misericórdia para com os seus, a não ser porque assim lhe apraz, tampouco disporemos de outra razão por que rejeita e exclui aos demais, senão pelo uso deste mesmo beneplácito ou cumula de misericórdia a quem quis, com isso são os homens admoestados a não buscar nenhuma outra causa que esteja fora de sua vontade.


(João Calvino / As Institutas - Edição Clássica – v.3 - p. 407 - 408)
Postado por Flávio Teodoro

segunda-feira, 24 de dezembro de 2007

Lloyd-Jones e a defesa da verdade


EXCLUÍDA A JACTÂNCIA


"Onde está logo a jactância? É excluída. Por qual lei? Das obras? Não; mas pela lei da fé. Concluímos, pois, que o homem é justificado pela fé sem as obras da lei. É porventura Deus somente dos judeus? E não o é também dos gentios? Também dos gentios, certamente, Visto que Deus é um só, que justifica pela fé a circuncisão, e por meio da fé a incircuncisão. Anulamos, pois, a lei pela fé? De maneira nenhuma, antes estabelecemos a lei." - Romanos 3:27 - 31

Minha observação final sobre esta questão consiste em assinalar que o grande apóstolo nunca se limita a meras declarações positivas, porém muitas vezes condescende em argumentar, em entrar em polemica, porque sente que deve fazê-lo. Digo isso porque acho que atualmente há muito pensamento frouxo, falso e fraco sobre a questão de polêmica e de argumentação em debate. Ao que parece, a atitude de muitos é: "Não queremos argumentos. Dê-nos a mensagem positivamente, e não se incomode com os outros conceitos". É importante que compreendamos que, se falarmos desse modo, estaremos negando as Escrituras. As Escrituras estão repletas de argumentação, de polêmica. E o apóstolo vê a necessidade disso aqui. Tendo acabado de fazer o seu arrazoado e tendo chegado àquele clímax tremendo sobre a doutrina da expiação, subitamente pergunta: "Onde está logo a jactância?" "É porventura Deus somente dos judeus? E não o é também dos gentios?" "Anulamos, pois, a Lei? Fazendo isso ele está argumentando, está discutindo; isso é pura polêmica.

A reprovação da polêmica na Igreja Cristã é uma questão muito grave. Todavia essa é a atitude da época em que vivemos. Hoje a idéia predominante em muitos círculos da Igreja é a de que não devemos importar-nos com essas coisas. Contanto que sejamos cristãos de algum modo, de qualquer modo, tudo estará bem. Não discutamos doutrina, sejamos cristãos unidos e falemos do amor de Deus. Nisso consiste realmente toda a base do ecumenismo. Desafortunadamente, essa mesma atitude está se insinuando também nos círculos evangélicos mais firmes, e muitos dizem que não precisamos ser demasiado precisos nessas coisas. Entretanto, se alguém começar a fazer objeções a claras declarações acerca da doutrina da expiação, estará começando a argumentar, a discutir. É importante termos claro entendimento da doutrina da expiação. "Ah, mas você está começando a argumentar agora", dizem. "Você não deve argumentar, isso perturba, isso vai causar divisão entre as pessoas".

O que estou tentando mostrar é que, se vocês sustentarem essa opinião, estarão criticando o apóstolo Paulo, estarão dizendo que ele estava errado, e ao mesmo tempo, estarão criticando as Escrituras. As Escrituras argumentam, debatem, discutem, estão repletas de polêmica. Vocês não poderão ler esta Epístola aos Romanos, ou a Epístola aos Gálatas ou na verdade qualquer destas Epístolas, sem perceberem isso claramente. Sejamos claros no que queremos dizer. Isso não é argumentar por argumentar, não é manifestação de espírito de contestação; não é condescender em preconceitos pessoais. Isso as Escrituras não aprovam, e, além disso, elas têm muita preocupação acerca do espírito com o qual se entra numa discussão. Ninguém deve discutir por discutir. Sempre devemos lamentar essa necessidade; mas, embora lamentando-a e deplorando-a, quando virmos que um assunto de vital importância está em perigo, devemos engajar-nos na discussão. "Devemos lutar zelosamente pela verdade", e o Novo Testamento nos conclama a fazer isso. O apóstolo Paulo mostra gratidão aos membros da igreja de Filipos, e dá graças a Deus por eles, porque tinham perseverado com ele desde o principio "na declaração e na defesa da verdade". E não há nada que seja mais completamente contrario ao método do novo Testamento que dizer: "Sejamos positivos, esqueçamos os termos negativos, jamais discutamos estas coisas".
Enquanto os homens e as mulheres não tiverem claro entendimento da verdade, enquanto forem tendentes a deixar-se levar pelo que é falso, devemos contender pela verdade, devemos engajar-nos no tipo de argumentação ilustrado nos versículos que estamos considerando. Devemos saber por que Paulo agiu dessa forma. E me parece que aí temos as razões pelas quais ele o fez.

Exposição de Romanos v. 3 – Editora PES – Autor D. Martyn Lloyd-Jones – p. 140 -142.
Postado por Flávio Teodoro

sexta-feira, 21 de dezembro de 2007

Quem surpreende quem? O Espírito Santo ou Jack Deere?


Richard L. Mayhue

Dr. Jack Deere, ex-professor do Seminário Teológico de Dallas, famoso cessacionista convertido à posição não-cessacionista com respeito aos atos miraculosos de Deus através dos homens, relata sua trajetória em Surpreendido pelo Poder do Espírito . Sustenta que os cessacionistas têm argumentado mais sobre o “silêncio” do que sobre texto explícitos da Escritura, e por isso torcem a Escritura, uma vez que não há passagem alguma na Sagrada Escritura que comprove esse ponto. Nesta breve análise do seu trabalho resta patenteado que Deere, como de resto os não-cessacionistas, cometem erros de interpretação que redundam em conclusões biblicamente infundadas de que os atos miraculosos de Deus têm continuado para além da Era Apostólica – ainda que com menor qualidade e freqüência.

Em três lugares em seu livro, Surpreendido pelo Poder do Espírito ,
o Dr. Jack Deere apresenta algo como o seguinte cenário hipotético.
Se um recém-convertido, que não sabe de história do Cristianismo ou de Novo Testamento, fosse trancado numa sala por uma semana, com uma Bíblia, sairia dali crendo que os milagres fazem parte da experiência atual da Igreja. Seria necessário um teólogo muito astuto para convence-lo do contrário.

O que responder diante disso?

À primeira vista e sem muita reflexão, alguém pode concordar com isso. Quando, porém, se dá uma segunda olhada nesta rápida declaração ocorre uma situação em que tanto se pode concordar quanto discordar . Concordar que um novo convertido, totalmente alheio à história, que não tenha nenhuma experiência de interpretação bíblica, e não seja dotado de nenhuma ferramenta de estudo, pode concluir que a Igreja de hoje experimenta milagres tal como a do primeiro século. Mas, poderá discordar , totalmente, e provavelmente o leitor há de convir, que o novo convertido tenha muita ou alguma possibilidade de estar correto. Desde quando um novo convertido com apenas uma Bíblia em mão é uma autoridade em correta análise teológica, isso no tocante a tema tão complexo como milagres? Além disso, por que o teólogo precisa ter "experiência" com o miraculoso para crer que as Escrituras são suficientes, sem o recurso da experiência, para enunciar uma doutrina clara (2 Tim 3:16-17)?

Emerge dai uma grande questão para Deere e os seus seguidores: por que a conclusão de qualquer teólogo treinado, com conhecimento histórico e capacidade para fazer uso de boas ferramentas de estudos bíblicos, deve ter o mesmo peso de uma conclusão imatura de um novo crente que não sabe nada? Não pode ocorrer que este esteja simploriamente utilizando uma combinação de experiência e teologia ré-determinada
para de qualquer maneira sobrepor a iminentes conclusões razoáveis?

Não pensam assim as várias pessoas que o autor e/ou editor solicita para endossar a obra ora em análise. Wayne Grudem, professor de Teologia Bíblica e Sistemática do Trinity Evangelical Divinity School, escreve, "Esta é a resposta mais persuasiva que eu tenho lido às pessoas que dizem que os dons extraordinários como curas e profecias não são para os dias de hoje”.
Ora, se Grudem detém as mais altas credenciais de estudioso, presume-se que ele tenha compulsado todos os melhores volumes que tratam da matéria e entendeu que o livro do Dr Deere ofereceria uma contribuição superlativa para o esclarecimento deste assunto.

Outros famosos personagens têm oferecido comentários igualmente entusiasmados. "Este livro é verdadeiramente um marco !”
escreveu C. Peter Wagner do Fuller Theological Seminary. R. T. Kendall, ministro da Westminster Chapel de Londres, tem entusiasticamente sugerido, "Simplesmente escrito, brilhantemente discutido, a tese do Dr. Deere é, em minha opinião, irrefutável."

Considerando a bem propalada conversão de Deere ao não-cessacionismo e o seu visível relacionamento John Wimber e Paul Cain, além dessas recomendações excepcionais, alguém que leva a sério o ministério do Espírito Santo deve seriamente ler livro de Deere, usando o "método de Beréia" de examinar a Sagrada Escritura para ver se as coisas são exatamente assim (Atos 17:11). A palavra de Deere corresponde à Palavra de Deus?

ANTECEDENTES DO AUTOR

Deere possui vários títulos acadêmicos: bacharelado em Texas Christian University, mestrado (ThM) e doutorado (ThD) em teologia em Dallas Theological Seminary. Ensinou em Dallas Theological Seminary de 1976 até 1987 quando a instituição o despediu por causa de suas posições não-cessacionistas. (39-40).
Segundo o autor, ele originalmente defendia uma forte visão cessacionista em consonância com o seu treinamento e experiência docente no Dallas Theological Seminary - DTS. Depois de um ano de viagem a estudo à Alemanha (1984-1985), voltou ao DTS no ano escolar 1985-1986 (16). Enquanto convidava o Dr. John White, um psiquiatra britânico, para pregar numa conferência de igreja, Deere teve sua vida mudada, em vinte minutos de conversa ao telefone com White em janeiro de 1986 (14, 23).

White serviu na Comunidade Vineyard de Anaheim, pastoreada por John Wimber, desde meados de 1985 (35). White esteve em Fort Worth em abril de 1986, para uma série de conferências, fato que foi relatado por Deere no Capítulo 2 do seu livro. (25-32). Várias semanas mais tarde, Deere encontra-se com Wimber
ai mesmo em Fort Worth (33). Como resultado, Deere e Wimber se tornaram bons amigos; Deere visitou Comunidade Vineyard de Anaheim em várias ocasiões durante 1986-1987 (39).

Depois de sua saída do DTS em outono de 1987, Deere também foi integrado à equipe pastoral da Comunidade de Kansas City pastoreada por Mike Bickle (38). Ele então fez planos para se mudar para Anaheim e tornar-se pastor auxiliar de tempo integral de John Wimber (40).

Deere permaneceu com Wimber até inicio de 1990, quando voltou para a área de Dallas-Fort Worth. Daí em diante, Deere escreve e dá palestras no mundo todo sobre os dons do Espírito Santo.

Pelo próprio testemunho de Deere, John Wimber, o psiquiatra britânico John White e Paul Cain tem exercido as maiores influências sobre ele (35-43). Além disso, quatro meses de intenso estudo das Escrituras de janeiro a abril de 1986 (24) e suas experiências (15-43) combinaram-se para convence-lo de que os dons extraordinários ainda operam hoje na Igreja da mesma forma que no primeiro século.


SINOPSE

Deere divide sua obra em três seções distintas com três apêndices:

1. Chocado e Surpreendido (13-43).

2. Concepções Despedaçadas (45-159).

3. Buscando os Dons e o Doador (163-207).

Os apêndices apresentados,

A. Outras Razões Pelas Quais Deus Cura e Opera Milagres (210-220).

B. Os Dons Espirituais (Miraculous Gifts)
cessaram com os Apóstolos? (221-243).

C. Houve Somente Três Períodos de Milagres? (245-258).

Além disso, inclui uma extensa lista de notas de rodapé e de citações bíblicas.



Chocado e Surpreendido

Deere começa com um conjunto de três capítulos, vinte nove páginas acerca da confissão de como, em janeiro de 1986, os seus melhores argumentos cessacionistas, acumulados durante os numerosos anos de pastorado, estudo em nível de doutorado e outras pós-graduações em seminários teológicos não suportaram vinte minutos de conversa com o psiquiatra John White (17-23). Depois dos próximos quatro meses de estudo das Escrituras, Deere tornou-se não-cessacionista que crê que Deus cura e fala hoje (23). Em algum tempo não designado no passado, a esposa de Deere, Lessa, tinha abraçado a posição não-cessacionista (17) e tinha estado orando freqüentemente pela sua conversão (17-19).

No Capítulo Dois relata a conferência de White na igreja de Deere em Fort Worth (26-33). Como resultado do ministério de White e a introdução de Deere no ministério de Wimber, Deere freqüenta um encontro promovido por Wimber no Texas (35). Conseqüentemente, após esse encontro, Deere ficou amigo íntimo de Wimber (39) e subseqüentemente encontra-se Paul Cain, na época associado a Wimber (cf. 169).

Esta seção, que de forma autobiográfica relata odisséia de Deere, tem um propósito claramente declarado (43):

Nas páginas que se seguem, quero compartilhar com você algumas das coisas tenho aprendido nestes últimos anos, tanto nas Escrituras como na experiência prática. Elas o ajudarão a aprender como perseguir e experimentar a os dons do Espírito sem os abusos que tanto tem prejudicado a Obra de Deus. Também quero compartilhar com você das objeções teológicas que eu tinha ao atual ministério Espírito Santo, bem como as respostas que removeram de mim tais objeções. Finalmente, quero discutir os temores e os empecilhos que tenho experimentado ao tentar ministrar no poder do Espírito Santo, e como essas coisas vêm sendo removidas.


Concepções Despedaçadas

Deere continua com sua narração autobiográfica através do Cap. 4 "O Mito da Pura Objetividade Bíblica " (47-59) quando conclui que "nenhum escritor cessacionista que conheço tenta firmar seu ponto à base exclusiva das Escrituras" (58).

Os capítulos 5-6 relatam o que para ele seriam as três razões maiores por que os crentes bíblicos não crêem nos dons miraculosos do Espírito Santo hoje:

Eles não os têm visto (58, 61-76).
Eles não podem encontrar os milagres semelhantes aos do Novo Testamento na história da igreja (76-80).
Eles estão confusos com os dons mal utilizados, ou o que eles assim considera, nas igrejas contemporâneas e nos movimentos de cura (81-90).

No Capítulo 7, "Assustados Até a Morte pelo Espírito Santo," discorre sobre (1) o ministério da Rua Azusa, (2) John Wimber e Jonathan Edwards, (3) textos selecionado da Escritura, e (4) experiência pessoal, numa tentativa de validar a teoria de que Deus está dando manifestações físicas hoje.

O ponto crucial da tese de Deere está nos Caps. 8-10, "Eram os Milagres Temporários?" "Por Que Deus Cura?" e "Por Que Deus Concede Dons Miraculosos?". Deere conclui, "também não se pode dizer que os milagres tinham o propósito de confirmar os Apóstolos, ou provar a autoridade das Escrituras" (116). Ele aduz , "Em Tiago 5:14-16, Deus comissiona a Igreja [a curar] . . ." (129). Além Disso ele diz, "1 Corinthians 12-14 apresenta seis razões que se aplicam tão bem aos dias de hoje quanto no primeiro século da Igreja . . ." (142).

No Cap. 11 "Por Que Deus Não Cura" Deere não chega a negar que há algo de bom nas doenças (155-57). Mas ele conclui que (1) apostasia, (2) legalismo, (3) fé morna, e (4) plano do Deus fazem com que descreiam nas curar (147-55). Ele termina por apelar para 2 Cron. 7:14 como uma promessa que ele crê ser válida para hoje (157).


Buscando os Dons e o Doador

Os capítulos finais tratam da paixão do cristão e o seu amor por Cristo. A seção em que Deere adverte contra as igrejas que colocam a questão dos dons acima de qualquer coisa (173-77) é recomendável. O Capítulo 13, "Paixão por Deus," relata a falta de paixão de Deere enquanto era cessacionista (184, 186-87) e como ele recuperou sua paixão como não-cessacionista (189-94). No capítulo final` "Desenvolvendo o Amor e o Poder" argumenta que (1) a paixão por Deus é a chave para o poder (195-6) e (2) os cessacionistas não têm nenhum poder; portanto os cessacionistas não têm nenhuma paixão por Deus (186). Ele tenta provar seu ponto com umas cinco páginas de ilustração que ele recebeu segunda mão (203-6). Alguém não poderia admirar-se, então, que João Batista a quem Jesus disse que foi o maior dentre os nascido de mulher (Lucas 7:28) não tenha realizado nenhum milagre em seu ministério (João 10:41)?

No seu epílogo "Ouvindo Deus Falar nos Dias de Hoje" (201-07), Deere adia esta discussão para um livro próximo. Quem quer saber quais e por que as crenças do autor sobre revelação contínua da vontade do Deus têm que esperar para o anunciado, Surpreendido pela Voz de Deus ( Surprised by the Voice of God – Grand Rapids: Zondervan, 1994) que se informa que estará pronto para lançamento no outono de 1994.

Nos três apêndices, Deere discute contra Benjamin B. Warfield
, John MacArthur, e Peter Masters, os quais têm escrito de uma perspectiva cessacionista. Ele sustenta que os dons sobrenaturais vistos nos Evangelhos e em Atos não foram limitados para somente uns poucos (212-19) e que um apostolado do tipo adotado pelos apóstolos originais ainda existe hoje (221-43). No Apêndice C "Houve Somente Três Períodos de Milagres?", Deere questiona o modo de compreender de John MacArthur sobre os milagres (246-58).

HERMENEUTICA E EXPERIÊNCIA

Pela leitura seletiva, alguém pode pensar que Deere chegara às suas conclusões não-cessacionistas primeiramente através de um estudo cuidadoso da Escrtiura (22-23, 75, 99, 101). Deere mesmo testemunha, "A mudança em minha maneira de pensar não resultara de qualquer experiência ou fenômeno supernatural. Antes, resultara de um paciente estudo das Escrituras " (24).

Entretanto, suas próprias colocações colocam sérias dúvidas quanto à precisão desta percepção. Por exemplo, na descrição de sua conversão de cessacionista para não-cessacionista (13-41), ele lista dez maiores experiências para embasar seu testemunho:

1. conversa ao telefone o Dr. White (16-24);

2. a história de seu passado cessacionista (13-15);

3. sua esposa carismática ora por ele (15-16);

4. a conferência do Dr White (25-30);

5. um demônio possuindo um cristão (26-30);

6. uma mulher curada de um aneurisma (31-32);

7. seu relacionamento com John Wimber (33-37);

8. uma mulher curada de problemas crônicos (35-37);

9. seu relacionamento com Paul Cain (38-41);

10. o restabelecimento de Linda Tidwell (40-42).

Nas vinte e nove páginas seguintes descrevem uma experiência atrás de outra, ele não apresenta nem discute ou expõem uma única passagem da Escritura. Quando muito, ele apenas cita oito textos:

1. Fil . 2:25-27 (20)

2. 1 Tim 5:23 (20)

3. 2 Tim 4:20 (20)

4. Mateus 18:3-4 (30)

5. Lucas 8:26 (31)

6. Tiago 5:14-16 (31)

7. 1 Cor 14:24-26 (36)

8. 1 Cor 14 (38) .

Deere apresenta na seção subseqüente (45-86) três premissas que se admitidas, segundo ele, farão com que os cessacionistas encontrem condições de se converterem como ele o fez:

1. Se eles vêem milagres autênticos em sua experiência real (57, 61-76).

2. Se eles encontrarem milagres de qualidade idêntica a do Novo Testamento na história da Igreja (62, 71-76).

3. Se eles encontrarem uma cura com o uso de dons miraculosos na Igreja (62, 77-86).

Vamos rever então a situação hipotética mencionada no inicio deste artigo. Deere argumenta, "se você trancasse um crente recém convertido em uma sala, com uma Bíblia, e lhe dissesse para estudar o que as Escrituras dizem sobre curas e milagres, ele jamais sairia daquela sala como um cessacionista" (56). Ele segue com justamente essa sentença, "Eu sei disso de experiência própria . " Isso é chocante! Algo que ele nega, 'experiência influenciando sua teologia' (22-23) aqui ele admite. Isso é uma séria contradição. O que é mais incrível, isso não foi originalmente "sua experiência." Ele testifica no mesmo parágrafo que no tempo em que se tornou cristão nos anos 1960 até sua conversão, ele permaneceu cessacionista. Depois ele se refere que a "um teólogo muito astuto sem experiência com o miraculoso para convence-lo do contrário" (116). Ele sem querer marca bem o ponto: Jack Deere crê que sem experiência ninguém se torna um não-cessacionista. Ele escreve, "A minha experiência me tem conduzido a uma conclusão contrária a de MacArthur e seus pesquisadores" (274)
.

A propósito, a conclusão a seguir transcrita contida numa crítica à obra de Deere merece ser reproduzida:
De fato, a visão de Deere do papel do profeta e as "dimensões apostólicas" do ministério (especialmente como manifestado por Paul Cain) suscitam-se questões significativas sobre a sua leitura do Novo Testamento: À exceção do esquema de Scofield, Deere não tem trocado um sistema por outro que é tanto quanto ou mais manipulativo da Palavra de Deus?
Deere sugere que quando a experiência e o argumento se convergem, as pessoas se abrem para uma vida de surpresas infinitas em comprometimento com o Espírito Santo. Suas experiências pessoais pontuam cada capítulo. Realmente, há mesmo toda uma lógica que o livro apresenta de que o poder do Espírito é real acima de tudo por que Deere experimentou e constatou isso. De forma precária, ele chega a ponto de usar a experiência como uma forma de tradução expandida do texto bíblico.

Finalmente, Surpreendido pelo Poder do Espírito é mais uma contribuição para o crescimento de um gênero de literatura que junta a força do testemunho pessoal com uma hermenêutica que oferece aos fundamentalistas dispensacionais um novo método de abordar o texto bíblico. Mas, embora Deere ofereça uma bem-vinda alternativa à leitura Scofieldiana das Escrituras, infelizmente induz ao leitor à impressão de que a experiência religiosa si mesmo é que valida o que ele discute.

Apesar de, pelas razões delineadas na próxima seção, ser difícil sabe-lo, com certeza, é bem provável que Deere tenha incorrido involuntariamente em dois erros hermenêuticas fundamentais. O primeiro é a generalização , ou seja, a crença de que a ocorrência de um milagre no passado significa que nada impede que venha acontecer de novo, e portanto espera-se sua repetição. O segundo é o experimentalismo , ou seja, a aceitação de qualquer reivindicação de experiência miraculosa hoje como se da espécie que a verificada na história bíblica, então se permite que a experiência prove que Deus está atualmente operando a mesma espécie de milagres. O primeiro envolve uma hermenêutica biblicamente injustificável que considera que, a menos que as Escrituras neguem a continuidade de uma experiência, aquela experiência ainda continua e continuará. O segundo vê a experiência dentro da Escritura de tal modo que experiência seja o intérprete dela, em vez do contrário.
Deere nunca trata dos falsos milagres que têm existido por toda história da igreja. Ele não trata dos que reivindicam fazer grandes milagres mas que foram rejeitados por Cristo (Mat. 7:21-23). Talvez por que ele não está em aberto confronto com os falsos mestres de persuasão não-cessacionista, Kenneth Hagin e Benny Hinn.

Depois de ler os primeiros cinco capítulos, este revisor conclui que Deere foi convertido para uma posiciona não-cessacionista por causa da lógica de um psiquiatra britânico, as curas de John Wimber e as profecias de Paul Cain. Apesar de suas declarações no sentido oposto e por causa de seu próprio testemunho cuidadosamente escrito, parece bem provável que a Escritura teve papel secundário em seu processo de mudança.


EXEGESE E EXPOSIÇÃO

Se não bastasse o que foi demonstrado na análise sobre “Hermenêutica e Experiência", Deere ainda se excede na evocação de seleção de textos-prova, mas deixa patenteada exegética pouco sólida e exposição falha de textos bíblicos chave. Ele lança sérias acusações a partir de um tratamento ligeiro e superficial. Se não vejamos a ilustração a seguir.

O propósito de uma parte significativa do trabalho de Deere é tratar de curas.
O próprio subtítulo do livro é, "Professor do Seminário Teológico de Dallas Descobre que Deus Continua a Falar e Curar Hoje", o que dá a impressão de que o autor pretende tratar definitivamente de curas.

Qualquer pessoa recém convertida que deseja compreender a participação de Deus nas curas deve interagir com dois maiores textos bíblicos Isaias 53 e Tiago 5. Não é assim tão inconcebível. Logo a falta de atenção para Isaias 53 é uma grande surpresa para este revisor. Unicamente em um parágrafo em 299 paginas é mencionado Isaias 53. Em nenhum lugar Deere tenta explicar este texto tão significativo. Textos como Mat. 8:14-17 e 1 Ped 2:24 são igualmente negligenciados.

Deere cita Tiago 5:13-20 mais do que Isaias 53, entretanto, em suas mais ou menos sete referências não faz mais do que pequenas citações da passagem e não a explica no contexto de Tiago 5. Relata como os presbíteros de sua igreja chamavam os doentes para receber oração, supostamente em obediência a Tiago 5 (31). No entanto, Tiago 5 diz, "Está alguém entre vós doente? Chame os presbíteros da igreja...", justamente o contrário da prática descrita por Deere. Além disso, Deere afirma que em Tiago 5:14-16 Deus comissiona a igreja inteira a curar (130). Embora 5:16 envolve "orar pelos outros," mais como uma medida preventiva do que corretiva, o ponto alto da passagem está na função dos anciãos, e não na da congregação.

Um estudo sobre curas não pode ignorar Tiago 5. Entretanto, não basta meramente identificar a passagem e partir para tentar enquadrá-la a uma teologia ou experiência pré-determinadas, como Deere claramente faz. Em lugar algum o autor tenta encarar o texto e faze-lo responder a pergunta que formula, ou seja, "A passagem está limitada ao primeiro século ou é aplicável hoje? Aplica-se para toda humanidade ou somente Cristãos? Estende-se para todos Cristãos ou restringe-se a alguns? Seu propósito é preparar pessoas para morrer ou restaurar sua qualidade de vida? Refere-se a problemas emocionais, físicos ou espirituais? A prática é para ser adotada no culto público particularmente? Intenta-se envolver a unção simbólica ou medicinal? A cura é providencial ou miraculosa? A promessa é condicional ou absoluta?"

Deere usa textos obscuros tal como os encontrados em Jer 32:20 ou Gal 3:5 para estabelecer sua própria tese e desacreditar os que discordam dele. Por exemplo, ele cita pelo menos oito vezes Gal 3:5 para defender idéia de que os dons miraculosos de cura foram concedidos à igreja como um ministério contínuo até o presente. Ocorre, também, que em nenhum lugar ele supre o leitor de interpretações desta passagem que sejam ao menos confiáveis (possivelmente mais do que as apresentadas pelo autor) e por isso mesmo não tem nada a ver com os milagres. Nem dá conta aos seus leitores que justamente a palavra traduzida "milagre" pode ser facilmente traduzido por "poder" e refere ao poder de Deus na salvação (Rom 1:16; 1 Cor 1:18; 2 Cor 6:7; 1 Tess 1:5; 2 Tim 1:8).

Ele cita Jer 32:20 para provar que os milagres estenderam-se através dos dias de Jeremias. Mas não informa ao leitor que os expertos na língua hebraica e os especialistas em estudos do Antigo Testamento não estão de acordo quanto à correta interpretação passagem. A mesma característica aplica-se aos textos de 2 Cor 12:7 (288) e Marcos 16:9-20 (277).

Deere sugere que Rom 11:29`"Pois os dons e vocação de Deus são irrevogáveis"`ensina que os dons miraculosos do Espírito não cessaram com os apóstolos, mas continuam, uma vez que são irrevogáveis (289). Entretanto, o contexto de Romanos 11 requer que o assunto se refira à sua herança espiritual, não aos dons espirituais na igreja. Os charismata ("dons") de Romanos 11:29 evocam os dons da graça de Deus à Israel, referidos em Romanos 9:4-5. Eis ai um claro exemplo inadequada citação de textos-prova.

Em suma, o tratamento que Deere dá a alguns textos das Escrituras deixa muito a desejar. Por exemplo, ele não interpreta os principais textos como Isaias 53 e Tiago 5. Entretanto, ele coloca em realce passagens que pouco contribuem para a sua interpretação uma vez que estas outras oferecem várias alternativas legitimas de conotações não miraculosas, p.ex. Jer 32:20 e Gal 3:5 e outros textos-prova inapropriados. Escora-se em passagens menores e obscuras que são consideradas definitivas, ao tempo em que, dentro dessa ótica, dá atenção destacada às experiências.


SOBRE CURAS

Deere vê 1 Corinthians 12 como um texto bíblico básico para defender as curas para hoje (64-68). Ele raciocina que, uma vez que (1) os apóstolos eram os mais dotados de dons de todas as pessoas na Igreja, (2) os dons espirituais variam em poder e intensidade, e (3) os dons miraculosos não foram limitados aos apóstolos mas distribuídos por todo a Igreja, logo (1) há distinção entre sinais/maravilhas e "dons de cura" , e (2) é errado insistir que os milagres apostólicos constituem em padrão para medir curas hoje. Conclui-se então (1) que as curas hoje não serão tão espetaculares como as de Paulo ou Pedro, (2) que as curas não podem ser abundantes como na era apostólica, e (3) o que denota alguma falha em relação às aventada curas.


A resposta deste revisor é que Deere tem desenvolvido uma teoria mais sobre o que as Escrituras não dizem do que de sobre ele claramente diz. Sua teoria falha para várias razões:

1. A frase "dons de curar" é tão ambígua em seu contexto que ninguém pode realmente saber seguramente o que exatamente significa (1 Cor 12:9, 28, 30). Certamente algo tão importante como a teologia da cura física não deveria se embasar em um fundamento assim tão traiçoeiro.
2. Sua teoria não explica o declínio em qualidade e quantidade das curas apostólicas conforme a era apostólica ia desvanecendo.
3. Sua teoria não dá conta adequadamente de que "dons de curar" aparecem unicamente na lista de dons de 1 Corinthians 12.

4. Sua teoria não aborda a total ausência de instrução nas epístolas acerca de curas, com exceção de Tiago 5. A sugestão deste revisor é que Tiago 5 e 1 Coríntios 12, segundo a melhor exegese e lógica, não tem nenhuma conexão em seus contextos.

5. Sua teoria diz que em todas as Escrituras as curas não são proibidas ou não falam diretamente sobre uma cessação das curas apostólicas, então, implicitamente, as Escrituras ensinam que as curas são para hoje (18-19, 99-115). Uma vez que é impossível interpretar espaços brancos da Bíblia, isso é inadmissível para a discussão.

6. Ele parece contradizer sua própria teoria quando escreve, "Eu creio que Deus está operando na Igreja hoje qualitativamente os mesmos milagre do Novo Testamento, e creio que os tem feito eles por toda a história da igreja" (58). Os únicos milagres de qualidade. que conhecemos no livro de Atos, são aqueles da qualidade que eram realizados pelos apóstolos. Além disso, Deere mais tarde teoriza que os milagres da igreja estão abaixo do padrão se comparados com os dos apóstolos (66-67). Ambos não podem ser verdadeiros.

7. Em face da bem documentada história bíblica de milagres na Escritura, Deere definitivamente não explica por que períodos "menores" não vieram depois Moisés, Elias, ou Cristo. Ele somente afirma que uma continuidade, período de milagres abaixo do padrão, segue os apóstolos e continuam nestes dias. Seu argumento de silêncio está aquém da boa interpretação e faz dele perpetrador de falácia exegética de que acusa os cessacionistas (19).


SOBRE MILAGRES

Em geral, a discussão de Deere de temas teológicos maiores carece de uma qualidade sistemática, lógica, e categórica. Tome os milagres por exemplo. A metade do que ele aborda encontra-se nos Apêndices, que por definição envolvem "matérias secundárias ao fim de um livro."

Mas deixemos que o leitor decida se discussão das seguintes questões são primárias ou subsidiárias, em relação aos milagres: "Os Dons Miraculosos Cessaram com os Apóstolos?" e "Houve Unicamente Três Períodos de Milagres?" A discussão de ambas questões estão nos Apêndices. Em contraste, no Cap. 5, Deere dá sua opinião sobre se "Os Cristãos tem Razão Reais para Não Crerem nos Dons Miraculosos", uma questão secundária que deveria teria sido colocada num Apêndice.

Deere declara isso acerca da principio maior do cessacionismo de que os milagres cessaram com a conclusão da era apostólica:
Contudo, eles agora enfrentavam não apenas um obstáculo formidável, mas também intransponível, porquanto não podiam oferecer um único texto das Escrituras que ensinasse que os milagres e dons espirituais estavam confinados ao período do Novo Testamento. E pessoa alguma foi capaz de faze-lo (101).
A luz da afirmação acima, alguém poderia assumir que Deere pretende fazer com que um ou mais textos específicos da Escritura ensinem que os milagres e dons espirituais continuam por toda era da igreja da mesma maneira como visto em Atos. Entretanto, Deere não pode fazer isso porque estes textos simplesmente não existem. Nenhum lado vence ou perde o debate, seja o cessacionista, seja o não-cessacionista, baseado em uma passagem única, mas em conclusões dedutivas de numerosas passagens. Usando a mesma lógica de Deere em relação à doutrina da trindade divina, conclusões blasfemas com respeito àquela doutrina podiam resultar as quais seriam intoleráveis a Deere. Este revisor, portanto, não tolerará sua conclusão com respeito a milagres por causa de sua lógica distorcida.

Deere afirma, " nenhum escritor cessacionista que conheço tenta firmar seu ponto à base exclusiva das Escrituras ." (55). De fato, somente o oposto sim que é verdadeiro. Deere (o não-cessacionismo) constrói sua tese para os milagres nos dias presentes primeiramente sob a experiência (13-41). Os cessacionistas desejam construir sua tese e permanecer com as Escrituras somente. A apelação à história não é para estabelecer sua teologia, mas melhor para testá-la.


Este revisor poderia ter esperado ver Deere interage profundamente com o bem conhecido trabalho, Perspectives on Pentecost , por Richard Gaffin, especialmente o Cap. 5, "A Questão da Cessação" (89-116). Entretanto, Deere não faz nenhum comentário significativo sobre o posicionamento de Gaffin.

Ele interage com Caos Carismático de John MacArthur no Apêndice C (253-66). Começa com esta observação: "John MacArthur é um proponente moderno da visão de que havia unicamente três períodos de milagres no registro bíblico" (253). Mais tarde ele irrisoriamente escreve, "Mas o ridículo de tudo, na visão de MacArthur nós não podíamos chamar a ressurreição de Jesus Cristo como um milagre" (263).

Anteriormente, Deere, no seu livro, conta que quando dirigia um programa acadêmico em nível de doutorado aplicava questionários sobre milagres, os quais evidenciavam que os aderentes do cessacionismo se caracterizavam por uma suposta imaturidade (47-52). No Apêndice C, ele escreve sete páginas de milagres no AT (255-61) em uma tentativa de provar que MacArthur tem seriamente subestimado o elemento miraculoso do AT.

A seguir, alguns breves comentários sobre as colocações de Deere:
1. MacArthur pode confirmar todos o s eventos sobrenaturais citados por Deere, do mesmo modo que todos outros expositores bíblicos cessacionistas conservadores.

2. Deere incorretamente acusa MacArthur de dizer que todos os milagres na Bíblia estiveram limitados em três períodos (253). Espantosamente, Deere desqualifica sua própria acusação quando corretamente cita MacArthur como dizendo, " A Maioria dos milagres bíblicos . . ." (253).

3. O que MacArthur e os demais cessationistas desejam estabelecer é o fato bíblico de que a obra sobrenatural de Deus, mediada pelos homens, ocorreu principalmente, não exclusivamente, em três períodos. Até mesmo Deere admite isso (263).

4. Deere pode esquivar-se das definições relacionadas com o sobrenatural ou o miraculoso (263); contudo, todos reconhecem a diferença entre o agir sobrenatural direto de Deus, elemento o qual Deere tenta estabelecer como normativo, e o sobrenatural intermediado de Deus através dos homens.

5. Deere escreve, "MacArthur não quer aceitar como normativos quaisquer dos eventos sobrenaturais da tabela anterior" (264). Pode-se formular a mesma pergunta a Deere, "Você deseja aceitar criação, o dilúvio e Babel como normativos? Você deseja aceitar a destruição de Sodoma e Gomorra como normal? Você deseja aceitar as pragas do Egito como normativas?" Certamente que não! Somente porque é um ato específico ocorrido uma vez, não exige que necessariamente Deus o deve repeti-lo.

6. Deere afirma que " você não pode encontrar nenhum período na história de Israel quando eventos sobrenaturais não fossem entre o povo de Deus" (263). Para corrigir esta declaração, durante pelo menos dois períodos eventos sobrenaturais eram incomuns: (1) os quase 300 anos de intervalo entre Gen 50:26 e Êxodo 2:1 e (2) os mais de 400 anos de intervalo entre Mal 4:6 e Mat 1:1 em que não é encontrada nenhuma evidência de Deus operando sobrenaturalmente. Isto para não mencionar os milhares de anos representados por Gênesis 1-12, a mais os quais o registro em questão não cobre.

ATITUDES E MÁS REPRESENTAÇÕES

Aparentemente, Deere elaborou seu trabalho para servir mais de testemunho ou debate cheio de emocionalismo do que de discussão bem equilibrada e bíblica acerca de milagres.

Atitudes

Espalhadas pelo livro pululam observações, excessivamente exageradas e auto depreciativas, feitas pelo ora neo-contemporanista Jack Deere ao então cessacionista Jack Deere. Ele classifica os outros ainda que ainda são de uma determinada maneira identificando nessas pessoas o que ele próprio teria sido um dia. Eis alguns exemplos:

preconceituoso de forma ignorante contra os carismáticos e Pentecostais (259)
arrogante (29, 47-48)
nocivo à igreja (29)
enganador, manipulador, indutor da Igreja (30)
iludido com respeito ao pensamento de que sua teologia era excepcionalmente boa, quando era frágil (15, 35)
espiritualmente anêmico (184)
racionalista . (184)

Ainda assim, Deere quer que o leitor acredite que depois que se converteu à posição não-cessacionista, teve uma dramática reviravolta em termos de atitude e abordagem das Escrituras. Repentinamente ficou de mente aberta, paciente, e atento estudioso das Escrituras (22-23, 47, 75). A clara implicação aparente é que Deere não adotava esse método antes como cessacionista nem pode ser adotado por qualquer outro cessacionista.

Ele critica os estudiosos cessacionistas por não serem capazes de ler o original dos escritos históricos, escritos pelos pais da igreja em Grego e Latim (273). Sugere que a maioria dos não-cessacionistas pode? Se podem, desejam e isso sirva de ajuda em sua exegese/exposição do texto bíblico? Quando prevê que em própria existência a maioria da igreja vai crer e praticar os dons miraculosos do Espírito, ele espera as pessoas creiam nele ou na Palavra apenas (173)?

Ele quer que o leitor creia que ao para o investigador da verdade, sincero e de mente aberta, a Escritura, história e experiência apontam para a posição não-cessacionista (56). Suas afirmações, realmente muito fortes ou freqüentemente repetidas, não provam esse ponto. Talvez o que reflete mais essa atitude diante da questão como um todo é comparação que faz do argumento cessacionista com a posição não-cessacionista como tendo tanta força como a de um pardal em meio a uma tempestade de vento (104).

Más Representações

O ex-cessacionista Jack Deere, agora um destacado porta-voz do partido não-cessacionista, retrata os cessacionistas de forma caricatural ao invés de fazer uma descrição criteriosa. Os seguintes pontos ilustram isso:
1. Deere insinua que a maioria dos cessacionistas crê que os dons espirituais não vigem mais nos dias de hoje (136).
2. Deere pinta os cessacionistas como tão espiritualmente anêmicos que eles são completamente vulneráveis às deturpações sexuais tal como a pornografia (85-86, 133-134, 182) e homossexualidade (86).
3. Deere afirma que os professores de seminário cessacionistas são bitolados e arrogantes (22-23, 47-50). Logo, os seus estudantes, até mesmo os de nível de doutoramento, são hesitantes e tendem a retrocederem quando são confrontados com um bom pensamento teológico (50-57).

UMA QUESTÃO FINAL

Se Deere, como ele admite, foi tão preconceituoso, tão bitolado, tão arrogante, tão espiritualmente anêmico, e tão teologicamente infundado como um cessacionista, que razão há para acreditar que ele é agora humilde, se m preconceitos, mente aberta, espiritualmente dinamizado e teologicamente correto? Isso só porque agora abraça uma teologia não-cessacionista? Será ele que dá evidencias convincentes de que é necessário passarem todos por uma reviravolta real e dramática de abandono do que crêem é ensinado nas Escrituras, e abraçarem as conclusões que Deere chegou ao final de sua odisséia espiritual?

Porque? Será que é porque se tem apoiado antes nas Escrituras, do que nas experiências para desenvolver suas crenças? Ele tem apresentado os que diferem dele de forma honesta e criteriosa? E a hermenêutica exemplar e as habilidades exegéticas que tem demonstrado para chegar a conclusões bíblicas?

Será que ele não tem mais se empenhado em um debate técnico preocupado marcar seu ponto, antes do que preocupado com um bem-arrazoado diálogo para a plena descoberta dos fatos? Será que a sua tese é biblicamente convincente?

A exemplo de outros, este revisor acredita que o trabalho de Jack Deere, em essência, é teologicamente defeituoso. Em vez de apresentar com a mente aberta um cuidadoso estudo, feito por um teólogo bem preparado, é mais como se fosse um produto de um novo convertido imaturo que, depois ler os evangelhos e o livro de Atos pela primeira vez, conclui que o que teve lugar no primeiro século continuará por toda a era da Igreja.

Então perguntamos, "Quem surpreende quem ?" O Espírito Santo surpreende Jack Deere, ou Jack Deere surpreende o Espírito Santo?

Richard L. Mayhue é Vice-presidente Sênior e Deão, além de Professor de Ministérios Pastorais.

NOTAS:

Jack Deere, Surpreendido pelo Poder do Espírito pela Casa Publicadora das Assembléias de Deus – CPAD, 1995, tradução de Surprised by the Power of the Spirit (Grand Rapids: Zondervan, 1993). Um livro posterior, Surprised by the Voice of God (Grand Rapids: Zondervan, 1994) pode ser considerado o desdobramento feito em 1994, a partir do "Epilogo: Ouvindo Deus falar hoje" 209-15. O objetivo desta revisão não é ser muito extenso, mas sim comentar seletivamente as maiores teses do trabalho de Deere. Concluímos que a posição de Deere é biblicamente indefensável o que logicamente não significa dizer que a posição cessacionista esteja prévia e razoavelmente firmada . Ela se sustenta ou cai considerando apenas o que as Escrituras ensinam.
Ibid., 57, 101, 116.
Ibid., 116.
Tenho propositalmente usado o termo "re-determinado" em contraste com "pré-determinado." Quando alguém muda sua teologia radicalmente como Deere fez (de persuasão cessacionistas para não-cessacionista), não está livre de qualquer pré-determinação; mas também sofreu pressão de uma abordagem menos objetiva (por reação) o que consiste em "re-determinação." Na melhor das hipóteses, ele agora é tão subjetivo quanto como era quando cessacionista, ou o que é pior, mais – não menos —vulnerável a possíveis erros.
Jack Deere, Surprised by the Power , endossos contidos nas orelhas do livro em inglês.
Ibid.
Ibid., contracapa do livro em inglês.
Outros que têm criticado a obra de Deere incluem-se Robert A. Pyne, BSac 151/602 (April-June, 1994):233-34; Larry L. Walker, Mid-America Theological Journal 18 (1994):126-27; R. Fowler White, "`For the Sparrow in the Hurricane,' A Review of Jack Deere's Surprised by thePower of the Spirit " ( paper inédito apresentado em 1994 ETS Eastern Regional Meeting).
Para ver o que Deere tem exposto em relação a John Wimber, leia John Wimber e Kevin Springer, Power Evangelism , 2ª ed. (San Francisco: Harper and Row, 1992), e John Wimber e Kevin Springer, Power Healing (San Francisco: Harper and Row, 1987). A defesa mais substancial do pensamento de John Wimber encontra-se em Gary S. Greig e Kevin N. Springer, eds., The Kingdom and the Power (Ventura, CA: Regal, 1993).
Na versão em português do livro de Deere, o tradutor infelizmente, na esteira do fazem diversos outros tradutores de livros originalmente escritos em inglês sobre o tema, incorre num equivoco ou falácia vocabular que induz um certo preconceito contra o pensamento cessacionista. Trata-se de traduzir a expressão “miraculous gfts” como “dons espirituais” querendo dar a entender que os cessacionistas não admitem os dons espirituais hoje, quando na verdade são questionados apenas os dons extraordinários em contraposição com os dons espirituais ordinários com os quais o Espírito Santo sempre tem cumulado a Igreja. Nota do Tradutor – ALS.
Para corrigir em futuras reimpressões, o editor deve notar que todas as referências de Marcos 9:40 a observação ao fim de Marcos (16:20 em opinião do Deere) deve ser omitido. Citações de Lucas 10:9, ao invés disso, 24:49 está erroneamente em seu lugar.
Este crítico não tem intenção de defender Warfield contra os ataques de Deere, outros que Deere menciona não adotam a mesma posição de Warfield. Quem interessar-se pode ler Warfield em Counterfeit Miracles (reimpressão, Londres: Banner of Truth, 1972), especialmente Cap. 1, "The Cessation of the Charismata" (3-31).
Citação da versão original em inglês. N.T.
Edith L. Blumhofer, "Dispensing with Scofield," Christianity Today 38/1 (January 10, 1994):57. Lembre-se que o dispensacionalismo não está em discussão aqui. Muitos dispensacionalistas e não-dispensacionalistas sustentam firmemente uma visão cessacionista dos dons miraculosos.
Veja o recente artigo , The Healing Promise (Eugene, OR: Harvest House, 1994), para uma discussão acerca do que a Bíblia diz sobre a cura física.
Para uma análise mais profunda da teoria de D eere's de que os dons miraculosos continuam além da era apostólica mas num nível menos elevado, leia Thomas R. Edgar, "An Analysis of Jack Deere on a Less Efficient Order of Miraculous Gifts" (paper ainda não publicado apresentadom em 1991 no ETS Eastern Regional Meeting).
Quando alguns lêem a discussão de Deere dos milagres na história pós-bíblica (73-76) e a compara com as citações históricas fornecidas por Walter J. Chantry, Signs of the Apostles , 2 nd ed. (London: Banner of Truth, 1976) 140-46, eles se espantam com os livros de historia que Deere lê.

Tradução livre: Anamim Lopes da Silva
Brasília-DF

quinta-feira, 13 de dezembro de 2007

"Conspiração contra o Sobrenatural "

L. Hérbet
(Um breve comentário sobre o livro "Surpreendido com a voz de Deus" do pastor Jack Deere)


"Surpreendido pelo Poder do Espírito" e "Surpreendido com a voz de Deus" são dois livros da autoria do Pr. Jack Deere, ex-professor de Antigo Testamento do Seminário Teológico de Dallas, e vendidos aqui no Brasil pelas editoras Vida e CPAD.

Bastante divulgados (e vendidos) no Brasil. Devem ser lidos com bastante cautela e à luz da Palavra de Deus. A questão central de seu trabalho é: As profecias, os sonhos e as visões ainda ocorrem nos dias de hoje? O autor desenvolve sua tese tentando provar que sim! Que Deus fala ainda hoje à sua igreja através desses elementos. O pior, ele acusa gravemente os historiadores cessacionistas de terem manipulado a história dos crentes do passado, omitindo fatos/ acontecimentos que comprovariam a manifestação genuína de sonhos, visões e profecias de crentes dos séculos passados, principalmente os puritanos.

O conteúdo desses livros está recheado de experiências (não que sejamos contra as experiências em si, mas sim o torná-las parâmetros para a interpretação das Escrituras) e uma pessoa que o autor destaca é o profeta de sua igreja PAUL CAIN, admirador de William Branham (conhecido por pregar que a doutrina bíblica da Trindade é na verdade uma doutrina de Demônios). Jack Deere é contudente em dizer que erros de profecias são aceitáveis, principalmente para quem está "aprendendo". [Segundo ele, é perfeitamente aceitável que] profecias, sonhos e visões podem estar equivocados. Ora essa, a Bíblia fala que os profetas ao entregarem as profecias, sonhos e visões, eram 100% corretos e elas se cumpriam integralmente. Então nos dias de hoje, alguém tem o "dom de profecia", mas ele pode entregar a você ou a igreja uma "profecia" que não se realizará (porque é falsa). Na verdade, ele fala até mesmo de uma "metodologia da tentativa e do erro" e que está "aprendendo tanto com nossas falhas o mesmo que com nossos sucessos". É brincadeira !!!

Mais interessante ainda é o argumento que Jack Deere dá aos seus opositores. Ele mesmo escreveu: "Não se pode aprender a linguagem do Espírito Santo sem a técnica da tentativa e do erro. E infelizmente os erros nos fazem parecer tolos, nos fazem sentir como tolos. AINDA ASSIM DEUS ESCOLHEU AS COISAS TOLAS E DESPREZADAS DESTE MUNDO PARA CONFUNDIR AS SÁBIAS E ORGULHOSAS (1CO.1:26-29). Qualquer um que se torne capaz de ouvir a voz de Deus terá pago o preço de parecer e se sentir um tolo muitas vezes" (grifo meu). Em minha opinião, o texto bíblico de 1 Coríntios 1: 26-29, citado pelo Pr. Deere para justificar seu pensamento, está totalmente fora de seu contexto. Forçou completamente sua exegese a fim de validar a sua idéia (exatamente como as seitas fazem).

O que me preocupa é o fato das Escrituras estarem sendo INTERPRETADAS À LUZ DAS EXPERIÊNCIAS; experiências que são pessoais, subjetivas, nesse sentido, têm sido elas o padrão de autoridade, e não o contrário. Vejam só (situação hipotética): em minha rua se reúne um grupo de crentes, liderado por um pastor, que durante 25 anos fora missionário em outras terras. Num certo dia, esse pobre pastor manifesta uma possessão demoníaca durante um culto. Diante desse fato, conclui-se que crentes podem ser possessos, contrariando as Escrituras. Nega-se as possibilidades do fenômeno não ter sido uma possessão demoníaca, mas de uma outra natureza; ou do "pastor" não ter sido realmente um crente genuíno, apesar de tanto tempo de evangelho e até mesmo liderando uma igreja. Bem, são de situações semelhantes a essa que várias doutrinas/ ensinamentos têm sido construídos e têm ganhado força nos círculos cristãos.

O pastor Jack Deere está hoje envolvido com o movimento das Igrejas Vineyard (fundada por John Wimber), movimento que, à semelhança da Willow Creek Community Church e Igrejas com Propósitos, tem crescido assustadoramente. Interessante destacar, que todos eles beberam da mesma fonte: dos conceitos e estratégias do maior mestre de Crescimento de Igrejas, o professor do Fuller Theological Seminary, C. Peter Wagner. Não é mera coincidência que encontramos o próprio Peter Wagner recomendando o livro (última capa), juntamente com o teólogo reformado Wayne Grudem, infelizmente se afundando cada vez mais.
Em minha biblioteca, livros como esses têm recebido o rótulo de "LIXO ou PERIGOSO", pequena tarja na lateral do livro para evitar empréstimos e também para lembrar de seu conteúdo.

No comentário anterior sobre os livros “surpreendido com a voz de Deus” e “Surpreendido pelo Poder do Espírito”, ambos de autoria do pastor americano Jack Deere, classifiquei esses livros como material descartável, lixo, perigoso. Talvez para alguns um posicionamento assim seja um tanto radical e ofensivo. No entanto, gostaria de explicar porque caracterizei tão duramente essas obras.

Os livros são muito bem escritos e seus temas e argumentos são muito bem organizados. Considero-os extremamente perigosos para o crente recém-convertido ou aquele que ainda está titubeando, com dúvidas entre a ortodoxia e a teologia pentecostal. O conteúdo dessas obras, principalmente do livro “Surpreendido com a voz de Deus”, mesclado de grandes verdades e [grandes] equívocos, tem se tornado em uma ferramenta potencialmente sedutora para o engano (apostasia). Bastante inteligente e com uma perspicácia admirável, Jack Deere constrói seus argumentos tentando convencer o leitor que Deus está falando hoje ao seu povo por meio de profecias, sonhos e visões, e que o próprio leitor pode vir a ser este canal/instrumento divino.

Minha crítica a Wayne Grudem, teólogo batista reformado, professor de Teologia Bíblica e Sistemática da Trinity Evangelical Divinity School, autor do aclamado livro de “Teologia Sistemática” da Edição Vida Nova, baseia-se no fato dele recomendar tal obra. É natural que você recomenda aquilo que aprova: “Livro excelente – bíblico, prático, divertido e perspicaz. Jack Deere não nos apresenta técnicas especiais para ouvirmos a voz de Deus; antes, ensina-nos a desenvolver um relacionamento. Este livro ajudará tanto a cristãos recém-convertidos quanto a santos amadurecidos em sua caminhada diária com Deus”. Wayne Grudem tem ensinado e defendido com muita sabedoria as verdades centrais do evangelho. Entretanto, discordo dele em relação à contemporaneidade dos dons extraordinários (1).

A partir de agora quero destacar alguns dos principais pontos levantados pelo pastor Jack Deere em seu livro “Surpreendido com a voz de Deus” (e infelizmente endossado por Wayne Grudem):

1. A conspiração contra o sobrenatural:

“Porque você nunca ouviu falar das pessoas [reformadores e puritanos dos séculos XVI e XVII; C. H. Spurgeon mais recentemente], mencionadas no capítulo anterior e de suas experiências sobrenaturais? Em parte porque a maioria dos livros que contam essas histórias se esgotou ou mesmo nunca chegaram a ser traduzidos, sendo muito difíceis de encontrar hoje. Mas houve também uma conspiração contra o sobrenatural por parte dos escritores mais recentes de teologia e de história da igreja” (grifo meu).Jack Deere faz uma gravíssima acusação contra [maioria] os historiadores da igreja, acusando-os de manipularem a história, distorcendo e/ou omitindo fatos ou acontecimentos. Tal acusação aponta, em minha opinião, para o caráter ou a moralidade desses indivíduos, que supostamente [para Deere] deveriam fazer parte de um mesmo “partido” para engendrar um plano tão maquiavélico como esse, que além de escreverem todos numa mesma direção, ainda conseguir impedir que outros, de fora do “partido”, publicassem suas pesquisas.

Interessante a sua afirmação anterior de que os livros que contam a “verdadeira” versão da vida daqueles crentes não existam mais ou sua quantidade é surpreendentemente limitada. Sabemos dos grandes recursos financeiros que dispõe o movimento de renovação carismática, e para editoras dessa linha o fator “tradução” não seria um grande obstáculo para a publicação desses livros (que certamente superariam as vendas dos atuais livros do gênero).
Os exemplos citados pelo autor não podem ser lidos acriticamente. É necessário um maior aprofundamento, principalmente porque a narrativa de uma história pode ser construída sob influência da concepção ideológica do próprio narrador. Um exemplo clássico disso é a referência/utilização (do “ponto de vista”), tanto por conservadores como pentecostais, do pregador inglês Martyn Lloyd-Jones para dar mais credibilidade aos seus argumentos (2).
2. O cânon aberto:

“Eu acredito nas profecias extrabíblicas; os que extinguem o Espírito são os que não crêem em sua validade”.Em minha opinião, esse é o ponto central de maior persuasão ao leitor para que se renda (seja convencido) à sua tese. De uma maneira inteligente Jack Deere comenta uma série de argumentos (capítulo 18) criados por ele (quando ainda pastor conservador) para refutar o ensino carismático das profecias extrabíblicas. Ele vai depois “destruindo” argumento por argumento, e de forma subliminar passa a idéia de que os crentes que ainda crêem somente na revelação bíblica são uma “espécie” de fariseus ou ignorantes espirituais.

O cânon aberto: aqui ele respondia (quando ainda era um pastor conservador) que todos os exemplos da Bíblia que tinham relação com os sonhos, visões e as profecias aconteciam porque a Bíblia não estava completa.Já envolvido com o movimento carismático, Deere afirma que “o argumento sobre o período do cânon aberto é simplesmente uma besteira teológica moderna. Foi inventado para explicar de outra forma qualquer exemplo bíblico que contradiga a atual escassez de experiências bíblicas. Não existe nenhum texto bíblico (...) que diga (...) que não precisamos mais ouvir a voz de Deus além da Bíblia. Pense na grande tolice desse argumento” [Para um estudo mais aprofundado sobre o encerramento das Escrituras e sua relação com as revelações atuais recomendamos os artigos da autoria de Hélio de Menezes (3)].
3. A suficiência das Escrituras ou da Interpretação?

“O deísta bíblico [infere-se todos os crentes (tradicionais) que discordam dele] fala muito sobre a suficiência das Escrituras. Para ele, a suficiência das Escrituras significa que a Bíblia é a única forma de Deus nos falar hoje. Ele gosta muito de repetir chavões como: “A Bíblia é tudo de que preciso para ouvir a Deus” e “Do que trata a Bíblia, disso devemos falar e, naquilo que silencia, devemos nos calar”. Apesar de o deísta bíblico proclamar em alta voz a suficiência das Escrituras, na realidade está proclamando a suficiência de sua própria interpretação das Escrituras”.

Contra seus opositores que rejeitam a autoridade divina das atuais profecias, sonhos e visões, quando Deus nada faz para garantir o entendimento dessas revelações, Deere argumenta que também não há certeza de que “Deus automaticamente garantirá que entendamos a Bíblia”. Para Deere, as revelações bíblicas como as extra-bíblicas são perfeitas, porque é impossível que Deus minta (Hb. 6:18), todavia, “não é impossível que nós entendamos mal a revelação infalível. E com um entendimento falho podemos extrair uma orientação falível da Bíblia, de um sonho ou de qualquer outra forma de revelação verdadeira”.
4. O método da tentativa do erro e do acerto:

"Não se pode aprender a linguagem do Espírito Santo sem a técnica da tentativa e do erro. E infelizmente os erros nos fazem parecer tolos, nos fazem sentir como tolos. Ainda assim Deus escolheu as coisas tolas e desprezadas deste mundo para confundir as sábias e orgulhosas (1 CO.1:26-29). Qualquer um que se torne capaz de ouvir a voz de Deus terá pago o preço de parecer e se sentir um tolo muitas vezes" (grifo meu). Deere continua: “Somente aqueles que estão dispostos a tentar e falhar se tornarão capazes de entender quais impressões vêm de Deus e quais vêm meramente de suas próprias almas”. Diante da forte possibilidade de ocorrer na igreja inúmeras profecias mal-sucedidas, o autor apela aos seus leitores a entenderem esse processo [método da tentativa do erro e do acerto] como sendo perfeitamente natural e harmônico com o ensino das Escrituras, interpelando a esses crentes que se esforcem para manter a unidade da igreja (4).
Assim, as inúmeras revelações [em nome de Deus] que têm provocado o desmantelamento de famílias e indivíduos, e gerado dor, ilusão, rompimentos, decepções e frustrações na vida de muitas pessoas, são apenas “tentativas” daqueles que estão “aprendendo” a “linguagem do Espírito”.
Considerações Finais:

Muitos teólogos e pastores, homens sérios e tementes a Deus, crêem no continuísmo dos dons extraordinários. Particularmente, apesar de discordar dessa doutrina, não creio que isso necessariamente desqualifica o crente como discípulo de Jesus. Porém, essa posição (que para mim trata-se de um sério erro teológico) localiza-se numa fronteira bem próxima do liberalismo teológico, que pode levar à igreja a abandonar a sã doutrina, abrindo suas portas para a apostasia. Levado adiante, essa [pseudo] doutrina gera (e como tem gerado!) conseqüências desastrosas para o crente individualmente e para a igreja.

L. Hérbet,
Editor da revista apologética cristã Sã Doutrina.
Notas:
1. Ver estudo “Os Dons Extraordinários”, de Luciano Hérbet, disponível em http://astrosnomundo.blogspot.com/2007/12/os-dons-extraordinrios.html ou Revista Sã Doutrina, 12ª Edição (www.revistasadoutrina.com);
2. "Martyn Lloyd-Jones, John Stott, e 1 Co 12.13: O Debate sobre o Batismo com o Espírito Santo" do pastor presbiteriano Augustus Nicodemus, disponível em http://www.thirdmill.org/files/portuguese/64267~9_18_01_4-11-16_PM~augustus6.htm.
3. Para a necessidade de maior aprofundamento sobre o tema, recomendamos os estudos de Hélio de Menezes no site Sola Scriptura-TT (http://solascriptura-tt.org/), especialmente o artigo "Milagres e Sinais Realizados Através de Crentes, desde Atos até Apocalipse", disponível em http://solascriptura-tt.org/Seitas/Pentecostalismo/22MilagresESinaisAtos-Apoc-SoApostolosEDiscipulos-helio.htm, e http://solascriptura-tt.org/Seitas/Pentecostalismo/So83ApostEDiscTiveramDonsSinais-Helio.htm.4. A respeito de um correto entendimento sobre a doutrina bíblica da unidade da igreja veja o excelente artigo “A Unidade Cristã”, da autoria de Marcos A. F. Martins – disponível no site da Revista Sã Doutrina (RSD 7ª Edição) - http://www.revistasadoutrina.com/download/sd_07.pdf ou no site A Espada do Espírito: www.espada.eti.br/unidade.asp

quarta-feira, 12 de dezembro de 2007

OS DONS EXTRAORDINÁRIOS

L. Hérbet


A Bíblia em 1 Coríntios 12: 7-11, Efésios 4: 11-12 e 1 Pedro 4: 10-11 revela-nos que o Espírito do Senhor concede aos crentes habilidades sobrenaturais para que a igreja possa cumprir a sua missão no mundo até a volta de Jesus Cristo. A relação dos dons espirituais é enorme (1 Co. 12: 4-11, 28-30; Rm. 12: 6-8; Ef. 4:11; 1 Pe. 4: 9-10): profecia, ensino, cura, hospitalidade, milagres, sabedoria, socorro, generosidade, etc. Dentre os dons espirituais, existiu um grupo de dons especiais que foram destinados a autenticar diante dos judeus incrédulos à nova mensagem vinda da parte de Deus – o evangelho de Cristo. Chamados de dons extraordinários, os dons de milagres, cura, exorcismo, profecia, línguas e interpretação foram concedidos aos apóstolos e outras poucas pessoas próximas dos discípulos e apóstolos (1).

Esses sinais especiais atestavam a pregação da nova mensagem e removiam qualquer pretexto de dúvida ou incredulidade de quem estava ouvindo. Foi exatamente o que aconteceu com João Batista quando encarcerado e em momento de dúvida e angústia, foi confortado por Jesus quando mandou lhe dizer: "... Ide, e anunciai a João as coisas que ouvis e vedes: os cegos vêem, e os coxos andam; os leprosos são limpos, e os surdos ouvem; os mortos são ressuscitados, e aos pobres é anunciado o evangelho." (Mt. 11: 4-5). Por isso, Paulo foi capaz de afirmar: "Porque o nosso evangelho não foi a vós somente em palavras, mas também em poder, e no Espírito Santo..." (1 Ts. 1:5). Esse poder foi manifestado frequentemente através dos apóstolos quando muitos eram curados de suas enfermidades, ressuscitados e libertos da opressão e possessão demoníaca. O evangelho, as boas novas, era algo novo, uma mensagem nova para aquele povo que não reconheceram o Seu Messias; ainda não tinha o Novo Testamento sido escrito. A confiança dava-se na palavra falada dos apóstolos (a mensagem proclamada), e por isso aprouve a Deus confirmar a pregação de seu evangelho através de sinais e maravilhas.

Em Atos 5:12 lemos que "muitos sinais e prodígios eram feitos entre o povo pelas mãos dos apóstolos" e quando questionado sobre sua autoridade apostólica, Paulo responde que "os sinais de meu apostolado foram manifestados entre vós com toda a paciência, por sinais, prodígios e maravilhas." (2 Co. 12:12). Portanto, no meio deles, da igreja e do povo em geral, Deus estava confirmando o ministério dos apóstolos, validando suas pregações e ensinamentos através dos sinais, dos milagres, curas e expulsão de demônios. Podemos, então, concluir claramente que Deus destinou esses dons aos apóstolos e poucas outras pessoas no início da igreja.

Se esses dons, os extraordinários, não são mais para os dias da igreja atual, então alguns questionamentos bastantes pertinentes são: Deus cura hoje? E como Ele o faz? Ele ainda opera milagres em nossos dias? A nossa resposta é um firme e forte sim; Nós não podemos restringir ou anular a soberania de Deus. Não cremos que já cessaram milagres, mas sim nos moldes como os pentecostais pregam. Deus pode, por exemplo, de acordo com a sua soberania, atender positivamente a oração de uma igreja local ou família e curar uma pessoa de alguma doença letal ou suprir de forma sobrenatural alguma necessidade de um servo dele. Tendo isso em mente partiremos agora para uma breve descrição de cada dom extraordinário:

· O dom de Profecias:

As profecias possuíam duas dimensões: a predição de algum evento ou fenômeno no futuro e a exposição do que Deus disse. Exemplos claros do primeiro aspecto da profecia podem ser vistos em toda a Bíblia. No A. T. os profetas anunciaram muitas ações ou fatos que aconteceriam no futuro. No N. T. encontramos Ágabo alertando a igreja que um período de escassez, marcado por uma grande fome, se aproximava (At. 11:28). Os apóstolos registraram os eventos que antecedem e envolvem o retorno de Cristo, bem como o que aguarda os crentes fiéis após a Sua volta. Na segunda dimensão vemos que a obra ou ministério de quem Deus destinava o dom da profecia era de receber e declarar a Palavra de Deus sob o controle absoluto do Espírito Santo. O profeta falava inspirado diretamente pelo Senhor. Esse dom era imprescindível e vital antes das Escrituras do Novo Testamento. Após o cânon, as Escrituras dos apóstolos passaram a ser lidas e recebidas pelas congregações como a autorizada Palavra de Deus.

· O dom de Línguas e de Interpretação:

A Bíblia registra que a manifestação primária desse dom ocorreu durante a festa de Pentecostes (At. 2: 1-13). Claramente nos é revelado que a natureza dessas manifestações era em idiomas. Ininteligível para quem falava (a não ser que o mesmo tivesse também o dom de interpretação), mas perfeitamente inteligível para quem era originário ou educado naquele idioma. Os próprios pentecostais e carismáticos se dividem quanto à interpretação da natureza desse dom. Somente forçando bastante a exegese dessa passagem para se chegar a outra conclusão. Alguns então, para corroborar a outra interpretação sobre a natureza das línguas não ser de idiomas humanos, e sim linguagens celestiais ou angelicais, afirmam que somente nesse episódio se tratou de idiomas, sendo todos os outros eventos subseqüentes se tratar de linguagem celestial (2).
Será que aconteceu também entre os anjos alguma Babel? Se a linguagem é angelical ela é única ou de vários "idiomas" angelicais? Nas Escrituras não existe uma única passagem relacionada aos anjos se expressando oralmente onde não seja entendida sua linguagem pelos homens. Até mesmos os Serafins, que estão diante do trono de Deus, foram perfeitamente compreendidos pelo profeta Isaías (Is. 6: 3, 7). Trata-se de um erro exegético usar da linguagem de 1 Co. 13:1 para justificar a existência de uma linguagem própria dos anjos, ou então deveríamos fazer o mesmo com Lc. 19:40 insinuando uma linguagem pétrea. Os dons de interpretação seguem a mesma lógica dos dons de línguas. São habilidades especiais concedidas pelo Espírito para interpretar na linguagem local dos ouvintes aquilo que está sendo pronunciado pelo dom de línguas.

· Os dons de milagres, prodígios e sinais:

De uma forma geral, todos os dons extraordinários são considerados sinais e prodígios, mas podemos agrupar aqui o dom de curar milagrosamente, de repreender e expulsar demônios e de ressuscitar os mortos, como foi o caso de Paulo ao ressuscitar Êutico (At.). Já está posto que esses dons serviram para confirmar o testemunho dos apóstolos e daqueles seguidores mais próximos. Em muitas igrejas atuais existem ministérios de curas e de libertação espiritual, focadas no exorcismo. Nenhum crente, com exceção desses anteriormente mencionados, nem no passado ou no presente, possui autoridade para repreender ou ordenar alguma coisa a Satanás. Nós somos guardados de sua fúria unicamente pela presença do Espírito em nós. Embora o crente não possa ser possuído por nenhum tipo de demônio, pode sim, ser oprimido por ele sob a permissão divina. Creio que, estabelecida a igreja pelo fundamento dos apóstolos, passa a ser agora a pregação do evangelho a única maneira para se libertar o endemoniado (3). Quando o pecador recebe o evangelho e crê em sua mensagem, ele é perdoado de todos os seus pecados bem como é liberto das cadeias de Satanás. Para um possesso ser liberto hoje ele precisa crer no evangelho e qualquer crente pode conduzi-lo a Cristo.

Muitos têm associados os dons extraordinários com a doutrina pentecostal do "batismo com o Espírito Santo". Eles ensinam que essa experiência vem acompanhada desses sinais, principalmente o dom de línguas. Alguns chegam a afirmar que até mesmo o pastor Martin Llyord-Jones (já falecido), ministro da capela de Westminster, Inglaterra, defendia a contemporaneidade dos dons extraordinários. Apesar de esse grande teólogo reformado ter crido que o batismo com o Espírito Santo era uma experiência após a conversão, ele não cria na continuidade dos dons extraordinários para a igreja após o período apostólico (4). Embora esses dons não existam mais, permanece hoje uma variedade de dons concedidos pelo o Espírito Santo à igreja. Cada crente tem recebido o seu dom para desenvolver e exercer com zelo e dedicação à obra do Senhor, de modo que a igreja está equipada pelo Espírito para proclamar a Cristo como o Salvador do mundo.

Flávio Teodoro & Luciano Hérbet

NOTAS:

1. "Todos os milagres/ sinais/ prodígios/ maravilhas realizados através de crentes, desde Atos até Apocalipse, foram dons concedidos como características exclusivas e identificatórias (ver 2Co 12:12) dos 13 apóstolos e dos 70 discípulos = 83 varões ex-israelitas escolhidos pelo Cristo manifestado em carne e osso, tendo eles sido testemunhas oculares de todos os dias dos mais de 3 anos de ministério de Cristo na terra, e da Sua ressurreição corporal. Por isso, na Bíblia somente encontramos esses 83 apóstolos e discípulos como homens através dos quais Deus concedeu o dom de operar milagres/ sinais/ prodígios/ maravilhas". Hélio de Menezes em "Milagres e Sinais Realizados Através de Crentes, desde Atos até Apocalipse", disponível em
http://solascriptura-tt.org/Seitas/Pentecostalismo/22MilagresESinaisAtos-Apoc-SoApostolosEDiscipulos-helio.htm, e http://solascriptura-tt.org/Seitas/Pentecostalismo/So83ApostEDiscTiveramDonsSinais-Helio.htm.

2. "As línguas faladas em Pentecostes eram da terra, humanas, entendidas pelos naturais sem necessidade de intérpretes; as línguas faladas em Corinto, ou o Dom do Espírito, eram sobrenaturais, celestiais (...). Não são, portanto, iguais as línguas faladas em Pentecostes e em Corinto. No primeiro caso, foi um ato esporádico, singular, sem exemplo de repetição...". Pr. José Rêgo do Nascimento. Livro Calvário e Pentecoste, páginas 101 a 112 (Infelizmente não tenho mais a capa do livro, que data de 1960, e por isso a omissão do restante da referência bibliográfica).

3. Para a necessidade de maior aprofundamento sobre o tema indicamos a obra de Thomas Ice e Robert Dean, Jr. "Triunfando na Batalha", da Editora Chamada da Meia Noite, onde os autores abordam com bastante fundamentação bíblica as questões sobre batalha espiritual, opressão e possessão demoníaca e o exorcismo.

4. "É extremamente importante notar que o pensamento de Lloyd-Jones sobre o selo ou batismo do Espírito, é essencialmente diferente da posição pentecostal clássica, e da posição neopentecostal. Lloyd-Jones não vê nenhuma evidência bíblica de que esta experiência deva ser acompanhada pelo falar em línguas e pelo profetizar, ou por qualquer outra manifestação extraordinária. Na verdade, ele chama a atenção para o fato de que muitos dos dons que foram concedidos no início da Igreja Cristã não haviam sido mais concedidos no desenrolar desta mesma história. Ele aponta para o fato de que nenhum dos grandes nomes da História da Igreja, conhecidos como tendo passado por experiências profundas com o Espírito (que ele considera como tendo sido esse "selar" ou "batizar" do Espírito) terem manifestado dons como línguas, profecia, ou milagres. Para Lloyd-Jones, o ponto essencial desta experiência também não é a capacitação de poder, como enfatizado em círculos pentecostais e carismáticos, mas a certeza dada de forma direta, pelo Espírito, de que somos filhos de Deus". Extraído do artigo "Martyn Lloyd-Jones, John Stott, e 1 Co 12.13: O Debate sobre o Batismo com o Espírito Santo" do pastor presbiteriano Augustus Nicodemus, disponível em
http://www.thirdmill.org/files/portuguese/64267~9_18_01_4-11-16_PM~augustus6.htm.


Referências Bibliográficas:

01. BÍBLIA. Português. Bíblia Apologética. Traduzida por João Ferreira de Almeida. São Paulo: Almeida, Corrigida, Fiel da SBTB. ICP Editora.

02. FOULKES, F. Efésios – Introdução e comentário. 2. ed. São Paulo: Mundo Cristão, 1993.150 p.

03. ICE, T., DEAN, R, Jr. Triunfando na Batalha. 1. ed. Porto Alegre: Chamada da Meia Noite, 1995. 215 p.

04. LLOYD-JONES, D. M. O Comportamento cristão – Exposição de Romanos capítulo 12. São Paulo: Editora PES, 624 p.

05. MACARTHUR, J. F, Jr. Os carismáticos. 5. ed. São José dos Campos: Editora FIEL, 2002. 216 p.

06. MENEZES, H. Milagres e Sinais Realizados Através dos Crentes, desde Atos até Apocalipse. Disponível em:
http://www.solascriptura-tt.org/. Acesso em: 23 de Setembro de 2007.

07. MORRIS, L. I Coríntios – Introdução e comentário. 1. ed. São Paulo: Mundo Cristão, 1992. 199 p.

08. NICODEMUS, A. Martyn Lloyd-Jones, John Stott, e 1 Co 12.13: O Debate sobre o Batismo com o Espírito Santo. Disponível em:
http://www.thirdmill.org/files/portuguese/64267~9_18_01_4-11-16_PM~augustus6.htm>. Acesso em 22 de Setembro de 2007.

sábado, 17 de novembro de 2007

A fé é conhecimento certo e seguro, como se acha fundamentado em Deus e em sua Palavra


João Calvino


Acrescentamos que a fé é um conhecimento certo e seguro, cuja qualificação expressa a mais firme constância de sua persuasão. Pois, como a fé não se contenta com opinião dúbia e mutável, assim tampouco com uma noção obscura e confusa; pelo contrario, requer certeza plena e fixa, como costuma ser em se tratando de coisas experimentadas e comprovadas. Ora, a incredulidade tão profunda e arraigadamente se nos apega ao coração e a tal ponto lhe somos propensos, que sem árduo embate cada um não se persuade daquilo que todos confessam com a boca: que Deus é fiel. Especialmente quando se confronta com uma situação real, a insegurança de todos põe a descoberto a falha que jazia oculta.

Por isso, não sem motivo o Espírito Santo enaltece com tão nobres títulos a autoridade da Palavra de Deus, a fim de fornecer remédio a esta enfermidade e para que demos total crédito a Deus em suas promessas. “As palavras do Senhor são palavras puras”, diz Davi, “prata refinada em fornalha de barro, purificada sete vezes" [Sl 12.6]. De igual modo: “A palavra do Senhor é provada; é um escudo para todos os que nele confiam” [Sl 18.30]. Salomão, porém, confirma o mesmo com quase os mesmos termos: “Toda palavra de Deus é pura” [PV 30.5]. Mas, visto que nesta demonstração se consome o Salmo 119, seria supérfluo nesta matéria recitar mais textos da Escritura. Sem duvida, sempre que Deus, em tais termos, nos recomenda sua Palavra, indiretamente está a censurar-nos a incredulidade, porquanto ele não visa a outro propósito, senão que nos erradique do coração duvidas tão confusas.

Muitíssimos há também que de tal modo concebem a misericórdia de Deus, que daí recebem um mínimo de consolação, pois são, ao mesmo tempo, constringidos por misera ansiedade, enquanto duvidam que ele lhes será misericordioso, porque encerram dentro de limites demasiadamente estreitos aquela própria clemência que parecem estar mui persuadidos. Com efeito, assim ponderam consigo que certamente ela é grande e copiosa, derramada sobre muitos, a todos acessível e preparada; contudo, que é incerto se porventura também a si ela haja de chegar, ou antes, se porventura eles haverão de chegar a ela. Com este pensamento, é como se parasse em meio do caminho, apenas pela metade. Conseqüentemente, longe de levar tranqüilidade e segurança ao espírito, o perturba ainda mais com duvidas e incerteza.

Bem outro é o sentimento de [plena certeza] que nas Escrituras sempre se atribui à fé; isto é, que elimina a dúvida acerca da bondade de Deus a nós claramente manifesta. Mas, isto não pode acontecer sem que sintamos verdadeiramente seu dulçor e o experimentemos em nós mesmos. Por isso é que o Apóstolo deriva da fé a confiança, e desta, por outro lado, a ousadia. Pois assim fala ele: “No qual [Cristo] temos ousadia e acesso com confiança, pela nossa fé nele” [Ef 3.12]; palavras com as quais mostra absolutamente que não há fé correta a não ser quando ousamos apresentar-nos perante Deus com ânimo sereno. Esta ousadia não nasce senão da sólida confiança na benevolência e salvação divinas. Tão verdadeiro é isso que, com bastante freqüência, se usa o termo fé em lugar de confiança.

Postado por Flávio Teodoro

(João Calvino / As Institutas - Edição Clássica – v.3 p. 39-40)

A fé é sólida confiança nas promessas divinas e firme apropriação da salvação que Deus nos propicia

João Calvino


Aqui se revolve o principal gonzo da fé, a saber, que não julgamos que as promessas de misericórdia que o Senhor nos oferece são verdadeiras fora de nós; ao contrario, que antes as façamos nossas, abraçando-as interiormente. Desta admissão, afinal, nasce aquela confiança que, em outro lugar [Rm 5.1], o mesmo Paulo chama paz, salvo se alguém preferir deduzir a paz da mesma confiança. Ora esta paz consiste numa segurança que acalma e tranqüiliza a consciência diante do tribunal de Deus, segurança sem a qual, necessariamente, se sentiria sacudida e quase dilacerada por tumultuada perturbação. Caso permita esquecer-se de Deus e de si mesma, adormecendo por um momento. E, de fato, apenas por um momento, porque não desfruta por longo tempo desse mísero esquecimento, sem que seja espetada pela lembrança do juízo divino que a cada passo se apresenta aos olhos da alma.

Em suma, não há nenhum outro verdadeiramente fiel senão aquele que, persuadido por solida convicção de que Deus é seu Pai propicio e benévolo, por sua benignidade lhe promete todas as coisas; e aquele que, confiando nas promessas da divina benevolência para consigo, antecipa infalível expectativa de salvação. Como o Apostolo assinala nestas palavras: “Se tão-somente conservarmos confiança até o fim, e a glória da esperança” [Hb 3.6]. Porque ao expressar assim, declara que ninguém espera no Senhor como deve senão aquele que se gloria confiantemente de que é herdeiro do reino celeste.

Afirmo que ninguém é fiel senão aquele que, arrimado na certeza de sua salvação, zomba confiadamente do Diabo e da morte, como somos ensinados dessa magnífica exclamação sentenciosa de Paulo: “Estou persuadido de que nem a morte, nem a vida, nem os anjos, nem os principados, nem as potestades, nem as coisas presentes, nem as futuras nos poderão separar do amor de Deus, com que nos abraça em Cristo Jesus” [Rm 8.38, 39]. Assim, o mesmo Apóstolo não julga que os olhos de nossa mente possam ser bem iluminados de outro modo, a não ser que divisemos claramente qual seja a esperança da herança eterna para a qual fomos chamados [Ef 1.18]. E esta é a doutrina que ensina a cada passo: que somente compreendemos realmente a bondade de Deus quando estamos plenamente seguros dela.

Postado por Flávio Teodoro
(João Calvino / As Institutas - Edição Clássica – v.3 p. 40-41)

A certeza da que a fé nos confere de forma alguma exclui a tentação de dúvida e inquietude, ora mais, ora menos sentida

João Calvino

Com efeito, dirá alguém: enfaticamente outra é a experiência dos fiéis que, ao reconhecerem a graça de Deus para consigo, não só são tentados por inquietude, que freqüentemente os acossa, mas até, por vezes, tremem de gravíssimos temores, tão grande é a veemência das tentações desenfreadas para abalar-lhes a mente; o que não parece coadunar-se muito com essa certeza de fé! Conseqüentemente, impõe-se-nos resolver esta questão, se queremos que a doutrina supracitada se mantenha firme.


Nós de fato enquanto ensinamos que a fé deve ser certa e segura, não imaginamos alguma certeza que jamais possa ser tangida por alguma inquietude; senão que, antes, dizemos que os fiéis têm perpétuo conflito com sua própria desconfiança. Tão longe está de que coloquemos sua consciência em algum plácido repouso, o qual não seja absolutamente importunado por nenhuma perturbação! Todavia, por outro lado, de qualquer maneira que sejam afligidos, negamos que decaiam e se apartem daquela segura confiança que conceberam da misericórdia de Deus.


Nenhum exemplo de fé é mais insigne ou mais memorável do que aquele que a Escritura propõe em Davi, especialmente se visualizamos todo o curso de sua vida. Contudo, ele mesmo com freqüência se queixa de estar mui longe de desfrutar perenemente da paz de espírito. Bastará citar alguns de seus numerosos testemunhos. Enquanto censura os conturbados sentimentos de sua alma, que outra coisa censura senão sua própria incredulidade? "Por que te agitas", diz ele, "ó minha alma, e por que te perturbas dentro de mim? Espera em Deus" [Sl 42.5,11; 43.5]. Certamente que aquela consternação era evidente sinal de desconfiança, como se julgasse abandonado por Deus. Confissão ainda mais ampla se lê em outro lugar: "Eu disse em minha precipitação: lançado fui da vista de teus olhos" [Sl 31.22]. Em outro lugar também contende consigo em ansiosa e angustiada perplexidade; na verdade, formula uma indagação da própria natureza de Deus: "Porventura esqueceu-se Deus de ser misericordioso? Porventura rejeitará ele para sempre?" [Sl 77.7,9]. Mais duro é o que segue: "E eu disse: Isto constitui minha enfermidade; mas eu me lembrei dos anos da destra do Altíssimo" [Sl 77.10]. Ora, como que desesperado, a si mesmo se condena à morte; e não apenas se confessa sacudido de dúvida, mas, como se estivesse sucumbido no conflito, até mesmo imagina que nada mais lhe resta, porque pressupõe que Deus o havia abandonado, e lhe voltara a mão para destruí-lo, a qual outrora lhe era para auxílio. Por isso, não sem causa, ele exorta sua alma a que retorne a sua quietude [Sl 116.7], porque havia experimentado o que era ser arrojado por entre ondas turbulentas.


E no entanto, o que é admirável, por entre esses abalos a fé sustenta os corações dos piedosos; e na verdade alcança o viço da palmeira [Sl 92.12], de sorte a enfrentar a todos e quaisquer incômodos e se eleva para o alto; assim como Davi, quando poderia parecer esmagado, ainda que incriminando a si mesmo, não desistiu de buscar a Deus. Aquele que, deveras, lutando com a fraqueza pessoal, em suas ansiedades insiste com a fé, em larga medida já é vencedor. O que é licito concluir desta citação e similares: "Espera no Senhor. Sê forte; ele te fortalecerá o coração. Espera no Senhor" [Sl 27.14]. Davia si mesmo se acusa de desânimo e, repetindo o mesmo duas vezes, se confessa seguidamente sujeito a muitos sobressaltos. Entrementes, não apenas se desagrada a si próprio nessa falhas, mas aspira e se esforça em corrigi-las.


Por exemplo, caso se compare com o rei Acaz, logo se verá perfeitamente a diferença entre ambos. Isaías é enviado a levar remédio à ansiedade do rei ímpio e hipócrita. Ele lhe fala com estas palavras: "Estejas em guarda e aquieta-te; não te atemorizes", etc. [Is 7.4]. Que faz ele ao ouvir isto? Como fora dito antes, que o coração lhe foi abalado como as árvores da floresta são sacudidas pelo vento [Is 7.2], embora ouvisse a promessa, não cessou de apavorar-se. Portanto, esta é a mercê e castigo próprios da infidelidade: estremecer de tal forma, que aquele que não abre para si a porta, pela fé, na tentação se afasta de Deus; em contraposição, porém, os fiéis, a quem vultoso volume de tentações encurva e quase esmaga, delas se alteiam constantemente, ainda que não sem embaraço e dificuldade. E já que são cônscios da própria fraqueza de espírito, oram com o Profeta: "Não retires totalmente de minha boca a palavra da verdade" [Sl 119.43]. Com essas palavras somos ensinados que eles, por vezes, emudecem, como se sua fé fosse prostrada, os quais, no entanto, não decaem nem viram as costas; ao contrário, prosseguem sua luta, e orando espetam sua letargia, para que, ao menos, por sua própria complacência não se entreguem à preguiça.

Postado por Flávio Teodoro
(João Calvino / As Institutas - Edição Clássica – v.3 p. 41-43)